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Não há mar que tanto malhe, nem navio que não encalhe!


Se eu pudesse pedir um desejo que me satisfizesse a alma e me trouxesse um só sorriso pediria, como as crianças fazem na sua inocência às estrelas, que me deixassem sem saber o norte, aos deuses que me escondessem da vida e aos anjos que se esquecessem de mim. Mas porque não há bruxas nem milagres, resta-me navegar o resto deste mar até que atraque um dia num qualquer porto de abrigo!
As velas deste navio já parecem andrajos de tanto que foram rasgadas e cosidas; o mar que tantas vezes me embalou os sonhos, alça agora a sua fúria e despeja sobre o convés vagas de espumado desvario e estica, até partir, o cordame já sem força.

Mas do leme brotam gritos de avante! Não há mar que tanto malhe, nem navio que não encalhe! Somos só dois: nave e eu! E o dia há-de chegar em que acabe todo o breu!
Meu vento são palavras; minha bússola meus poemas; ao leme o que me agarra é vencer minhas penas.
Haveremos de passar, muito além deste cabo, até além onde brilha o sol. E o mar, acariciando a quilha, embalará meu sono e as sereias hão-de cantar-me, ao ouvido, belas histórias de princesas, reis, rainhas e castelos dourados.
E voltarei a sorrir! Hei-de ver de novo o sol brilhar, numa manhã de primavera, quando os pássaros trouxerem no canto, sonhos de outra era. Hei-de então cantar com eles! E juntos haveremos de tropeçar num pedaço de céu para voltar a cair nos braços deste mar e ousar outra vez voltar a sofrer!

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