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Domingo na Cidade

 As ruas desertas mostram a nudez das horas. Um silêncio familiar atravessa os raios de sol mortiço que iluminam os entre-olhares dos recém amantes sentados pelos bancos da praça. Há promessas para nunca cumprir e o sempre que se sussurra não passa de uma jura inocente de que a primavera vai durar para a eternidade. Pelo correr das horas dir-se-ia que o peso do ar não deixa passar o dia.   Num banco de jardim, cercado de andorinhões, os meus olhos prendem-se ao fio do horizonte na boca do rio e finge grades férreas nas colunas de uma ponte suspensa das nuvens. A cinza abafada do céu acinzenta os gestos de quem passa e apenas eu testemunho. a primavera.   
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Inferno

Que dias estes em que me sobram horas. Momentos de nada fazer, pedaços de eternidade ínfima atravessados numa tarde feita de inferno. Brutal manhã que jaz a meus pés, senhora de um futuro em que se não contam tempos. Palavras que se derretem na brisa morna que não me acalma a alma. Escorrem minutos como se fossem horas, dias.

Uma Barca no Rio Dos Dias

  Pendurei minhas memórias no cabide do amanhã. Voltei as costas a um passado que me foge da lembrança. Já não sou quem fui e sei que serei sempre o que hoje não sou.   Agora, no abrigo de dias por vir, dispo esse antes e deixo que o calor dos sonhos me abrace a noite do hoje. Ficam ecos que se perdem em distâncias onde se calam os silêncios!   Neste rio dos dias sem ontem, deixa-se meu destino feito barca, beijar pelo passar de um tempo que nunca foi. Vazio que reste, menos será que a montanha feita de ontem. Foram-se os remos, rasgou-se o estai e escorre minha barca como uma lágrima sobre a face das águas. Sem caminho e sem  julgar destino.   Ruboresce o horizonte a jusante, prenhe de dias idos que se escondem pelos esquecidos montes que atrás deixo, neste caminho que leva ao mar dos tempos, onde desaguam todas as lágrimas que vertem as almas feitas barcas.

Insónia

O sono chega, olhando o antes sem memória. Agora nunca dormimos! Despejamos cansaços: vergamos o ontem ao que há-de vir! Partimos! Somos mais do que chegou, e menos do que amanhã! Cada noite é um adeus! A madrugada atreve gotas de orvalho nas entrelinhas da alvorada E espraia cinza pelo acordar do mundo. Enquanto isso, tudo roda! O sono chega, acordando o dia, profundo!

Margem Sem Rio

  Ouvem-se trombetas leito abaixo: feras de vermelho quase negro, escondidas no silêncio em que os inocentes se despegam dos dias e das horas. De longe ruge a noite dos antigos e treme a madrugada.   Do fundo do meu olhar brotam os tropeços da tempestade que veio matar as estrelas. O escuro cinza remata e tapa o horizonte imaginado de outras horas, de outros dias. Pelas escarpas calam-se ínfimos silêncios e pressente-se o dia que ninguém quer ver nascer.   Ao coração dos homens chega agora o canto de uma deusa feita de ferro e fogo. Os céus revoltam-se contra o mar que dança e desacerta o fim do mundo. A lua feita em quatro cobre-se de um manto de luzes negras e ribombam faíscas em troar de avisos. O néctar da guerra escorre pelas serras e aconchega o último sono dos condenados. O canto da trombetas desfia o ar da madrugada e tinge de gritos o amanhã.   Já foram águas que daqui levaram rios de gente e terra feita aquém-vida e sobretudo, rios de murmúrios. Restinga moribunda

Terras À Vista

Tropeçou meu destino em fim de tarde!  O verde-azul do horizonte enche-se de sangue por entre voos de gaivotas e gritos de dia sem história. Entretanto, meus olhos que, mais do que rios, têm mares infinitos e cristalizam os dias passados em doces memórias, empedreceram nos minutos que foram muros de minhas horas de vida.  De pouco valeu ser mais que gente e menos que bicho: tudo em redor mais não foi que palavra feita vento e sal. Memórias de cada onda que passou meus olhos, inundam a areia onde se espraiam agora as maresias da minha infância.  Só, como todas as horas, deitei corrida ao fim do mundo. Em sonhos, mais que em passada larga e destemida, cheguei quase tarde. Fui certeza e logro que me levou sem destino marcado ao encontro de um outro eu que não aquele. Fiz da noite capa de um destino que não cabia noutro lugar e nem podia: que eu sou feito de outros escuros e outros segredos; de outros mares além dos sete que me juram. Deixei de ser partida e sou, agora, apenas cheg

A voz do GPS: Chegou ao seu destino!

São palavras do GPS, metalizadas e frias de emoção. E temos aquela sensação estranha de saber se ficamos ou não contentes por chegar ao "destino", qualquer que seja. E quem não quereria viver a vida como se fosse um programa de GPS com o percurso calculado, previsão de chegada, estado da via, etc.? Eu não. A minha vida foi feita de estradas e encruzilhadas, sem GPS que me valesse. Olhando atrás só posso estar grato por, apesar dos "avisos à navegação" de vontades alheias, por bem intencionadas que fossem, ter feito as escolhas que fiz, as boas e as más, que me ensinaram tudo aquilo de que já não vou precisar nesta vida. Talvez, e o mais certo, é vir a precisar de tudo isso quando chegar ao momento que tanto é "chegada" como partida. "Partir" e "chegar" são as duas faces da mesma moeda. Quando começamos a viagem, deixamos atrás o "peso" dos minutos, horas e dias que fizeram parte daquele passado. E não voltamo

Já Não Quero Que a Saudade Regresse!

  Os amigos do princípio eram os companheiros do sonho de infância, povoando o imaginário de aventuras em que do nada se fazia tudo: bastava sonhar! Navegámos dias de todas a cores e, às vezes, tantas, só a preto e branco. Mas o que queríamos mesmo era voar nas asas do sonho. Éramos crianças!   Desses tempos me chegam aguareladas memórias e de quando em vez, um pequeno arrepio de tristeza esfria-me a nuca. De tão novo me ficaram lembranças de companheiros em quem, já tão cedo, vi mares de egoísmos e maldades das que não alcanço lembrar mais do que esse ligeiro frémito. Éramos crianças!   Fomos crescendo e, no meu mundo de aventuras, arrastado às costas da família andarilha, de terra em terra, fui deixando e colhendo em toda a parte saudades. Não lembro nomes. Recordo árvores, mato grosso e escuro, em recantos de aventura; savanas poeirentas, lar de feras; picadas de longos, largos e fundos trilhos; areias escaldantes, mordidas de pinha casuar; mar lúcido, feito esmeralda e correr

A Letter To My Children

                                    Oh, my beloved ones: dare I say that my generation had the previlege of living in the most exciting times of all?                                     We had it all: it has been a time of plenty for a large part of the human race. Science gave us so much incredible things that none of you can even start to imagine living without! Across the skies we have machines, heavy as houses, flying like birds; we can talk and see each other from noon to midnight apart; we learned and taught like never before... And still...                                     We had richnesses beyhond the wildest dreams and, for many, the chance to cross any border. Our generation had it all... But...                                     We also saw wars and famine and disgrace... We could have stopped it, for we had the means. But we also had greed like never before and payed tribute to the gods of present days. Betrayal became our pray, lying our lord! Our eyes, tha

Desert Heartland

The rumors have fled the furious wind by landing in the quietness of my broken past. Over the clouds the sun sat on the high peaks that reach for the stars. Down bellow, where the plains of plenty mourn for the glorious past, tears tell stories of dreams that were never meant to be. And the only thing left as a reminder is the empty look of a child that never knew how to smile. Yet, the small flower shivers with the passing of the chilling wind from the east. The future is just a shadow on the wall alighted by the fires of hell.

Streets of Yesterday

I run into a dream last night. I saw fires in every corner of the city; people gazing into the emptiness of the flames; children in quiet tiredness like stones cooling after a volcano eruption; women trying to cover their nudity behind the shadows of the alleys... I heard also loud silences coming from the tears of old men as they took trembling steps toward the abyss of shattered doors... I wandered the streets to find no birds in the red skies over my head; no dogs barking in revolt against the sounds they alone can guess. I fell on my knees to beg for the impossible return of joy, only to find a grayish morning with fat tears falling from the stars like leaves from trees in the shivering cold of a wet fall! From a broken window my eyes only had a glimpse of memory while my soul, no shame forgotten, wept like the silence rendering the day after in the battle field.

Gaveta de Rascunhos

   Mais um texto daqueles que descobri na gaveta dos rascunhos. Setembro 2011   Fogo Fátuo   Pelo ontem traçavam caminho meus passos sem rumo. Meu ser largou amarras junto a um vago cais, para deixar em terra as palavras que meus lábios nunca soltaram. Há um fresco e tresnoitado ar que desperta mistos de felicidade e angústia. De mão dada, vento e mar mostram memórias antigas onde te via voando pela rua. Alguma delas terá tropeçado no meu respirar e caído no rio, junto à borda, para fazer de conta que o todo o sal do oceano veio daqui, deste pequeno recanto entre as pedras por onde correm as minhas mágoas. No turbilhão dos minutos, revoltos como o teu cabelo longo, arrepios quentes percorrem-me o ser ao ritmo das ondas.   Terra dentro, por onde caminham os homens, há verdes campos por onde espraias tuas tardes e despejas o fogo dos teus olhos feitos mel e incenso. A tua voz vestida de nebelina despe-se em promessas de lua nova enquanto o bater do teu coração se aninha nas m

To Be, But Not To Be

  As minhas sementes de futuro perderam-se na enxurrada de uma tempestade da vida. Os sonhos que portavam secaram a penugem e criaram belas, viçosas, penas de uma vida por gastar. Por entre os cachos de luz, pendurados pela ramagem colorida,  gotículas de espaço transvasam a felicidade de copo em copo e criam-se os momentos por onde se arrastam os que nunca souberam dizer que as coisas têm mais que ser, do que aquelas que nos mostraram quando nasceram, elas e nós.   Ficamos prisioneiros da imobilidade que nos parece saber mais do que as respostas que procuramos, entre o sonho e a realidade. Fizemos um mundo feito de nós e perdemos, no entretanto , tudo aquilo que desejámos alguma vez ter, porque tivemos e depois cuspimos fora, como quem cospe, impune, sobre as ondas do mar. Aconchega-nos a certeza de que um dia, seremos mais do que aquilo que sonhamos. Ou menos! Em todo o caso, mais do que o que nos prometeram e não cumpriram.   Nada importa porém; são mais as coisas que fazem d

Fermenta a Cidade!

  O outro lado da vida cascadeia ao longe e o ar traz-me de rastos, as Notícias de uma manhã plasmática!   Esta cinza que me acompanha os minutos de torpor, espalha-se pelo meu ser como areia movediça. Perde-se o som da rua, aplastrado contra o solo da manhã humedecida. Descambam momentos pela ladeira rodeados de auras embaciadas. No resto de um quase nada de sol, cintilam "bons dias" entre o mendigo e a figura de uma eclésia civil. O motor desafinado rasga uma tentativa de vida junto a um semáforo. Não se escuta o desbragar das sirenes do costume. Ninguém pode cair se já está no chão.   Desagua na foz da hora, o braço curto dos minutos.

As Asas De Uma Galáxia

  Desesperamos pelo medo de vermos o sonho ser lapidado pela realidade crua com que se vestem as auroras. Perdemos o sentido no rodopio da flor do vento e deixamos negra e fugidia a figura que limitou o destino encalhar nas costas do mar de noites em vão. Somos apenas um nem-grão-de-areia na esfera que se perde na imensidão de uma glória feita de minutos que carregam séculos. Cada hora espraia seu cântico nas cordas do bater de alma com que os vivos se derrotam a si mesmos.   Já quase somos o quase nada que seremos depois do fim dos dias. Caminhamos de mãos dadas com o esquecimento e fazemos juras de fidelidade a destinos que sabemos nunca nos vir visitar. Resta olhar a maré dos dias que nunca acabam em noite e das noites que nunca dasaguam na foz da manhã.   No céu incolor que as nossas asas ciam, nem deixamos o rasto do ar que respiramos, rarefeito na sua perfeita  e imota cronologia. Somos cada dia um nada mais pequeno e invisível, mergulhado numa imensa galáxia feita de pequenos

O Circo e a cidade!

Retempero forças perdidas em batalhas que nunca quis pelear. Busco agora as dúvidas que também lá deixei e regresso à certeza dos dias com princípio, meio e fim. Agora já sei que a madrugada morreu no assalto final do sol que desembainhou manhãs e arremessou tardes raiadas de horas coradas contra os escuros minutos que desdormia. E agora também sei que amanhã a batalha continua e a guerra entre mim e a vida será sempre uma interminável comédia onde não cabem papéis principais. Ao cair do pano erguer-se-ão das plateias as almas que de seguida irão representar. Senhoras e Senhores, Meninos e Meninas: o Circo está na cidade!

Horas

Brutal como todas as verdades, a relativa velocidade de um ponteiro que marca as horas no relógio da vida é sempre um lugar vazio por onde passam os minutos. Confunde-se o momento de sono com a manhã cheia de futuro que não cabe nos lugares por onde caminham os vivos. Os sonhos ficam pendurados na madrugada para que as horas não se percam na memória quebrada!

O relógio que agora me acompanha e me faz contar o tempo

    Nem sei como escrever as palavras que não servem de tinta ao pincel que corre pela tela de que se faz o meu presente. Perco a hora por entre os ponteiros que marcam os traços de que é feita a minha vida. E não me sobra nada mais! Nem o relógio que até agora mediu os meus dias!   Perdi-me! Como se se perderam todos os homens antes de mim e se haverão de perder todos os que hão-de vir! Pelo caminho quis deixar sinais e setas que aos meus indicassem o caminho por onde passa o passo que não tropeça. Sei que o meu sonho tem mais poder do que eu e que nenhum de nós será um dia mais do que aquilo que fez com que possamos ser mais gente, nesse dia, para além das coisas em que nos fizeram acreditar. Venderam a minha alma e nunca perguntaram se eu tinha fome.   Viram-me passar por entre as lágrimas como um marinheiro que tende a vela por onde passa o vento que navega a eternidade. Fecharam as portas por onde entrava o ar que fazia de mim o sonho de ser tudo o que mais ninguém queria s

A casa

  Se não fosse pelas paredes cobertas de prisão e pautadas de janelas com portas por onde foge um destino e entra outro, não haveria casas. O medo da solidão percorre os raios de luminosidade por onde passa a memória que desiste de pendurar-se no acaso. Pede que lhe digam ao ouvido que aquele lugar é só seu. Nos seus silêncios se perde a certeza de ser-se apenas e só quem se é. Não há lugar para rumores nas eternidades que invadem o espaço entre paredes. Nem os sonhos escapam da prisão. São horas de ter que ser mais do que que aquilo que somos e um pouco mais ainda daquilo que queremos ser. A casa é o medo do futuro: a tremura perante as ferozes garras que ameaçam o dia com que havemos de nos descobrir. A casa é tudo aquilo que cada um sonha mas que sabe que não existir além de si.   Permanente como a certeza de que morremos todos, o sonho cresce como se possível fosse que um dia, tudo se arranje de forma a que o destino se confronte, cara a cara, consigo mesmo. A casa é tecto, é

Regresso

São os dias que contam, não as horas. Dentro das almas há suor que escorre de um fazer por ainda não ter sido feito. A multidão escondida entre os sons da cidade, ecoa passos pela noite descoberta, como se a luz do dia tivesse  deixado rasto. As paredes já não entornam o amarelo com que demarcam o escuro da vida que agora se junta, em rito de acasalamento, com as luzes da cidade. Insinua-se o negrume pelos recantos que acarinham as pedras da calçada cintilantes de passado, para deixar no ar fresco, pedaços de memória regados a morrinha de fim de Estio. Os homens esquecem que a satisfação é inimiga da criação e empanturram-se de dias largos de suor, para para poderem vangloriar-se da vida que se lhes escapa por entre os dedos.  Os crentes olham agora mais uma certeza quando passam pelas escadas da igreja, onde se espraiam outras almas na espera de algum transeunte que lhes compre um pouco de paz, em troco de uma esmola. Há sempre lugar para mais um, que ali chega por ter deixa